domingo, 26 de abril de 2009

é noite

Só encontro sossego
Quando o sol me deixa.
No escuro eu fico
Mais feliz
E lenta.

Envolta em fumaça
Traço retratos
Imagino futuros.
Reacendo
Na falta de luz.

Menos calor
E brota a calma.
Criativa a hora
Em que a noite começa.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

poema da chata

Parece que tomei rasteira
Da menina besta
Que mora aqui
Em algum lugar de mim.

Parece que tem doze anos
Escreve poema com rima
Tem medo do estranho
Não quer sair da linha.

Êta guria chata,
Larga do meu pé!

terça-feira, 21 de abril de 2009

protocolo

Acusam-me de viver
De acordo com protocolos
Que eu mesma crio
E embalo.

Não sigo minha vontade
Faço contas de cabeça
Durmo tarde.

Perco horas pensando
No que seria
E às vezes esqueço
Que terminou o dia.

Não faço minha vontade
Foi a acusação.
E tive que dizer:
“- Tens razão!”

segunda-feira, 20 de abril de 2009

universal

Não me convide
Pra ver o sol nascer
Em dia de chuva.

Se me prometer,
Cumpra.

Não faça convites
Pra festas
Que não existem.

Nem alimente conversas
Que não vão além
De um dia com pressa.

Quando quiser
Apareça
Mostre suas vontades
Ou me esqueça.

sábado, 18 de abril de 2009

polidez, pra quê???

É a polidez na entrega
Que nega o fim
Ou apenas posterga.

A palavra não dita
O sentir não declarado
Espicham o drama.
Pra não fechar
As portas
Do mito sagrado.

Não há segredo
Que dure pra sempre
A boca e a mão
Indicam o pecado
Em qualquer distração.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

uma vez, e sempre

Vejo o azul
acinzentado.
Penso em ti
E passo mal.

Um borbulho no estômago
Me revira o sentido
De não esquecer
Que só existe o sabido.

Torrente de um ciclo
Que segue seguro
Obedecendo à química
Que explica o mundo.

terça-feira, 14 de abril de 2009

olhos alheios

Sigo a me encantar
Com o efeito das palavras
Deglutidas por pessoas
Cada uma sem par.

Uma única frase
Ou um texto inteiro
Despertam milhares
De leituras sem freio.

Histórias mal entendidas
Sentidos devastados
Todos olhando pro mesmo
Mas cada um no seu quadro.

Divirto-me com respostas
Pra escritos
Que não eram propostas.

A visão de mundo
Por olhos alheios
Ensina a girar
Sem rodeios.


terça-feira, 7 de abril de 2009

"que se pasa, buenos aires?"

Ai, ai, ai
Por que me dói?
Tudo que nem começa
E já se vai.

Fazer mala
Sem saber
Se vai ter sol
Ou vai chover.

Sem conseguir
De todo
Desfazer o recente
Que não quer
Ser passado.

Casaco espremido
Será ele usado?

Anseio o cheiro de ruas
Por onde andarei
Sem olhar pra trás
Ao som de Coltrane.

sem fim

Não consigo ouvir o Drexler
Sem lembrar-me
Do amor
Que não quer acabar.

Ficou grudado
Espremido no corpo
Cutucando a memória.

Esforço pra crer
Que precisa sumir.
A sensação de que
A vida
Precisa existir.

Mesmo sem dias
De tintas das minhas
Viradas de rumo
Aceno de sonho
Poltrona macia.

Mesmo sem preguiça
De sair da cama
E vestir a camisa.

Do mundo lá fora
Mais frio e deserto
Sem uma perna
Roçando nas costas.

enchente

Tem coisas que a gente
Não quer sentir
Mas sente.
Incrível como a culpa
Estraga o corpo da gente:
Dói a barriga
Rangem os dentes.

Como é que pode?
Um sentir tão etéreo
Se materializar em enchente?

Deve ser por isso
Que a dor é anterior ao poema
A palavra precisa sair
Pra aliviar a represa.